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Estórias na Caixa de Pandora

Estórias na Caixa de Pandora

31
Mar20

Deve ser da chuva, do frio ou do ... isso!

Pareço uma indigente.

Não é que nos outros dias me produza e me arranje como num dia "normal" de trabalho, tenho vestido roupa de casa, leggings, t-shirts, sweats. Nada que me envergonhasse se tivesse de ir à rua ou abrir a porta a alguém.

Mas hoje... bem, a coisa está mais ou menos assim:

- Leggings térmicas (está um frio do catano)

- Meias peludas por cima das leggings (coisa mailinda)

- Vestido de moletom (tipo sweat) com interior tipo polar (já disse que tá frio?)

- Casaco felpudo por cima do vestido...

Se eu fosse para a rua nesta figura, só me faltava a caneca pra pedir esmola. Bati no fundo. Ou estou quase a dar o passo em frente, à beira do precipício.

Pela positiva: continuo a tirar o pijama todas as manhãs. E a lavá-lo todas as semanas, tá?! Ontem até lavei o roupão, mas houve um pequeno acidente caseiro com um dos gatos. Também continuo a usar soutien. Certo que tenho usado os de desporto, mas uso. Já li por essas internetes que o mulherio libertou as margaridas. Depois queixem-se da gravidade (a da lei e a da situação). Ando a aparar as sobrancelhas, continuo a ter os meus cuidados com a pele, só não me maquilho. Não sei quando poderei sair de casa, mas por enquanto ainda não pareço uma mulher das cavernas. Hoje só mesmo uma indigente. É o frio. E o humor de merda.

 

30
Mar20

Quarentena: dia 743 (não, é só dia 13, mas parece muito mais)

- Hoje é novamente segunda feira, só o sei porque estando a trabalhar convém não me perder nos dias (abençoado trabalho que me tem mantido ativa e ocupada)

- No fim de semana mudou a hora, foi menos uma hora em casa;

- Esforcei-me para não ver notícias... nem tanto por causa das atualizações do Covid, mas porque não tenho mesmo mesmo mesmo paciência para gente estúpida e egoísta, sim, esses mesmos que se meteram à estrada para irem de férias. Ide com a puta que vos pariu, andam a gozar com a cara de quem está nesta luta pelo BEM DE TODOS. Egoístas do caralho, bem que mereciam que vos nascesse um pinheiro no cu. No dia que vos bater à porta talvez, talvez, ganhem noção da gravidade da situação e daquilo que nos é pedido para ajudar a resolver, uma merda tão simples como FICAR EM CASA. Cabeças de pila (mas bem pequenina)... Há realmente gente que se um dia precisasse de um ventilador, era logo irem ter com o Criador e expiarem os pecados, a começar pelo egoísmo. Pronto... já descarreguei! Pardon my french. Partilho o desabafo que se tornou viral e espero, sinceramente, que chegue a todos, principalmente aos que a esta altura do campeonato ainda acham que está tudo normal e tudo isto é um exagero.

- Andei em limpezas no sábado, vidros limpinhos, até brilham! Tive o cuidado de ver se chovia nos próximos dias e supostamente não ia chover. Hoje está o tempo com cara de que vai cair chuva a qualquer momento. No próximo sábado posso voltar a limpar vidros, não? Há que manter o tempo ocupado

- Gandhe como está por casa e a empresa entra em lay-off a partir do dia 1 de abril, está a fazer a lista de material necessário para... rufem os tambores... pintar a casa! Andamos só há uns 3 ou 4 anos a falar nisso. É preciso vir uma quarentena forçada para dar vontade ao homem de passar dos planos à ação. Pergunta-me que cor(es) quero. Nem se pergunta: branco. BRANCO. Paredes brancas, tetos brancos. É como está, é como quero manter. Se por um lado ergo as mãozinhas por ver este projeto a começar a tornar-se mais real, por outro estou aqui a pensar a confusão que há-de ser eu a trabalhar a partir de casa, e a casa "em pinturas". Tudo se faz. Tempo não falta...assim como assim não se pode sair de casa. Ou pelo menos nós fazemos parte daqueles que estão a fazer que é recomendado pelas autoridades de saúde para combater esta pandemia. Verdade seja dita, e este exercício aplica-se a todos nós: quantos projetos têm para desenvolver em casa e nunca os puseram em prática porque não há tempo, depois também não querem "queimar" férias a fazer isso, etc? De certeza que uma grande parte de nós tem várias bricolages, arranjos, mudanças, reorganização, etc, para fazer em casa e vai adiando porque falta tempo e disponibilidade. Eis a oportunidade. Mãos à obra que, por este andar, chegamos a junho ainda de quarentena (sim, não se iludam que podemos sair antes de casa em segurança).

Por aqui começa-se mais uma semana de trabalho a partir de casa. E ao 13º dia há rotinas que já parecem mais normais. Ou menos estranhas.

 

26
Mar20

Quarentena: dia 9

Ontem saí mais tarde do trabalho. Já não tinha vontade ou energia para ir exercitar o esqueleto de maneiras que me entreguei à ronha e à preguiça, também mereço.

Verdade que uma pessoa agora com tantas aulas online, partilhadas nas redes sociais, até fica com dores nos "glúteos da vista" (autoria da Gorda, a quem desde já agradeço pelo bom humor que tanto me tem feito rir... será que ajuda a ter um six pack abdominal no verão? Troco já de treinadora...).

Além do exercício físico, é a partilha de receitas. Agora todos, além de serem muito fits e fazerem bué exercício físico em vez de sentar o cu no sofá, são também todos cozinheiros de mão cheia. Eu tenho é saudades de ver uma receita de um bolo que leve farinha. Farinha, daquela normal, T55 com ou sem fermento. Não, ou é farinha de amêndoa, ou de coco, ou de aveia, ou de arroz, ou do diabo a sete... precisaria sair de casa para ir ao hipermercado que tivesse essas modernices da cozinha do paleolítico, e ainda calhava de ser o hipermercado que fica mais longe da minha área de residência, de maneiras que a GNR mandava-me recambiada para casa sem farinha de amêndoa e stevia ou agave para fazer um bolo de iogurte... sem lactose, claro está.

Estou seriamente a pensar espalhar uns sinais de trânsito pela casa. Assim teria a real perceção de sair do trabalho, ter semáforos e rotundas pelo percurso, refilar com os cromos que não sabem o que é um pisca (essa merda deve ser um extra que não vem de origem nos automóveis) e obviamente não o usam para indicar a sua saída da rotunda.

Continuo a receber as newsletters que anunciam as sandálias que não posso perder este verão. Parece-me que está na hora de eliminar as newsletters de uma vez. Há uns tempos fiz uma seleção e passei só a receber das marcas que me interessam e consumo. Mas neste momento é só parvo, mesmo sem abrir, ler o assunto e ficar com vontade de espetar um prego ferrugento nos olhos. Mas depois teria de ir para as urgências e não há álcool para desinfetar.

Ontem uma amiga, que está a trabalhar a partir de casa e que faz, entre outras coisas, atendimento telefónico ao cliente, partilhou comigo um insulto de um cliente que, não deixando de ser um insulto reles e merdoso, ganha pela capacidade de contextualização nesta (ir)realidade que estamos a viver: "vá para o hipermercado ler rótulos de produtos a ver se o vírus a apanha". Uma pessoa tem de se rir com tamanha estupidez. E esperar que a lei do retorno do universo funcione em dobro. Ou triplo.

Por aqui entra-se no nono dia de quarentena com uma neura filha da meretriz.

Vou almoçar a ver se isto me passa.

 

25
Mar20

Quarentena: dia 8

Ontem tirei o pó à bicicleta estática. 30 minutos a pedalar, agachamentos e uma dor de nalgas.

Para o jantar uma receita nova que ainda não tinha feito: açorda de camarão. O resultado final não foi o esperado, em termos de textura (um erro na execução), mas o sabor, nhami nhami.

Gandhe recebeu notícias da empresa. Um caso confirmado, 26 em quarentena a aguardar contra-análise, uma vez que a primeira deu positivo ao covid, mas não apresentam sintomas. E ficamos assim um pouco mais apreensivos a ver os casos a acontecer mesmo ao nosso lado, num meio que faz parte do nosso dia a dia.

Vamos para o oitavo dia de quarentena...

O meu vizinho de cima, colega de trabalho do Gandhe, músico nas horas vagas, tem aproveitado a quarentena para ensaiar. Normalmente ele ensaia com phones e não se ouve muito. Por vezes ensaia sem phones e ouve-se mais pelo prédio. Não é que incomode, mas ouvir 30 vezes seguidas a mesma música é coisa para revirar os olhos. O que vale é que uma pessoa acaba por se abstrair. Ora o moço aderiu aos concertos em direto no Facebook. Anteontem anunciou um Live para as 17h de ontem. E pedia que as pessoas fizessem os seus pedidos em jeito de discos pedidos: que músicas querem que cante! Eu, espirituosa, fui comentar: The Sound of Silence... há quem esteja em teletrabalho, vizinho

Depois de uma troca de comentários simpáticos e até divertidos, ele alterou a hora do concerto para as 18h30. Agradeci muito a atenção. Temos de ser uns para os outros. Tenho bons vizinhos... Maria, há prédios com boa vizinhança, que seguram a porta do elevador, cumprimentam-se e perguntam se é preciso ajuda. Pronto, eu não moro no centro da cidade, moro numa vila periférica, a 5 min da cidade, mas com um misto de características de aldeia e outras de vila grande. Tenho sorte! E é nestes momentos que a reconhecemos e agradecemos por a ter.

A WOOK lançou uma campanha de 50% de desconto direto no 2º livro (promoção válida nos artigos assinalados). Não resisti e fiz uma encomenda. Mais dois livros para a biblioteca cá do burgo, os dois primeiros volumes de um autor que tenho na whislist há algum tempo. Houve um problema qualquer com o pagamento por MB Way, estou à espera que me mandem referências MB para proceder ao pagamento.

Ontem Gandhe foi até ao hipermercado mais próximo para fazer compras (alimentação). Foi mandado parar pela GNR. Estão no terreno a controlar quem anda na rua. Acho bem. Principalmente quando continua a haver muitos cromos com a mania que são filhos de Deus e estão imunes. Curiosamente a maioria é da terceira idade. Que raio se passa com eles? Está tudo maluco? É a rebaldaria dos idosos?

Planos para o oitavo dia? Cumprir o horário de trabalho, o que me mantém com a cabeça ocupa e a sentir-me ativa. Depois saio do trabalho e vou fazer exercício físico, ver se há novo vídeo da minha professora de cardio fitness. A seguir a jantar: peixinho hoje. Just another ordinary day...

 

24
Mar20

Quarentena: dia 7

Cheguei ao sétimo dia. Podia ser dia de descanso, não é. Terça é dia de trabalho.

Hoje faz precisamente uma semana que estive na rua pela última vez. Foi um dia "normal" dentro da anormalidade que já se vivia. Fui trabalhar para a empresa, e à tarde desmontei o meu posto de trabalho para vir de "malas e bagagens" para casa.

Antes de regressar a casa para uma quarentena de tempo indeterminado fui fazer a manutenção das unhas de gel. BUUUUUUUUHHHHHHHHH, sua fútil!!!

Ora bem, eu costumo deixar de uma vez para a outra a marcação feita. Intervalo de 4 semanas, sempre. Portanto estava marcada. Depois, e porque vi que uma série de outras pessoas estavam já a fechar portas às suas atividades, nomeadamente a minha cabeleireira que é das que trabalha apenas e só por marcação, sendo que a cliente seguinte, se não se atrasar, chega e está a anterior de saída. Nunca, nos anos que já lá vou, vi aquele salão cheio de gente a fazer sala e a falar da vida alheia. Um dos motivos por que fidelizei àquela cabeleireira. Ora, trabalhando ela já com estas restrições, e tendo decidido fechar portas ainda antes do Governo decretar estado de emergência, perguntei à menina que me faz as unhas se estava a trabalhar. A resposta dela não podia ser mais sincera, como aliás é assim que ela é: sim, está a trabalhar, até porque tem dois filhos pequenos para criar e uma casa que comprou o ano passado para pagar. Sim, está a trabalhar até porque ainda antes deste caos já ela trabalhava de luvas e máscara, agora tinha cuidados extra na desinfeção constante dos materiais e pedia às clientes que antes de se sentarem lavassem as mãos ou as desinfetassem com o gel próprio para o efeito que ela lá tinha. E pôs-me à vontade se quisesse ir, ou desmarcar como já muitas clientes estavam a fazer. Eu fui. Primeiro porque já estava marcado e, já que ia ficar fechada em casa por tempo indeterminado, ao menos que tivesse as unhas arranjadas (que pena, estão tão bonitas para estar fechada em casa sem as exibir ao mundo, mas isto é para mim, para eu me sentir bem... ajuda, acreditem. Não estivessem arranjadas e eu já teria voltado ao meu antigo hábito de as roer, ainda mais em situações de stress). E depois porque efetivamente é o trabalho da rapariga. Fecha portas não ganha... e já estava ela, nesse dia, extremamente preocupada por ser declarado o estado de emergência e ver-se obrigada a fechar.

Portanto, antes de atirarem pedras a quem vai fazer as unhas ou tratar do cabelo, pensem que aquilo que para uns é um "luxo" de cuidado e bem estar pessoal, para outros é o seu trabalho, o seu ganha pão. E num país que, ainda não há muitos anos, passou por uma crise económica com altos índices de desemprego, altura essa em que apresentava o empreendedorismo e a criação do próprio negócio como a salvação da economia das famílias, o que vai fazer agora com essas mesmas pessoas que foram empreendedoras, abriram o seu próprio negócio, têm-se mantido ativas e a trabalhar nos últimos anos e agora são forçadas a fechar portas? Pois...

Só para que conste, se a minha cabeleireira estiver a trabalhar na altura em que já tenho marcação para ela, eu vou. Porque sei que seremos só as duas no salão, porque ela usa luvas para me pintar e lavar o cabelo, porque me vai mexer no cabelo e não na cara, e pronto, não podemos dar beijinho, certamente não convém conversar porque não seria possível manter os 2m de distanciamento, mas com os cuidados necessários seria perfeitamente exequível. Seria mais inócuo que os passeios que muita gente anda a fazer aos magotes, porque está sol e crime é desperdiçar o dia soalheiro e o tempo disponível para ficar em casa.

Mas pronto, entendo e respeito. Nada de cabeleireira e nada de unhas até não sei quando...mas podem haver palhaços a correr padarias e pastelarias para se sentarem a tomar o pequeno almoço, ler o jornal do dia e ter dois dedos de conversa com o compadre. E indignados que ficam se por onde passam ou está fechado ou não lhes permitem sentarem-se para degustar, como se nada se passasse, o seu pequeno almoço. True storie, como tantas outras que uma amiga que está a trabalhar na caixa de um supermercado vê todos os dias. Os piores, indica ela, os "inocentes" velhinhos, que vão várias vezes por dia ao supermercado, ora buscar um pacote de natas para fazer um bolinho, ora buscar a tinta para pintar o cabelo que a filha da mãe da cabeleireira está fechada, ora buscar outra merda qualquer de extrema necessidade (só que não). E quando chega a vez de entrarem na cafetaria, sentam-se nas calmas a beber o seu café ou o seu chá, e o resto do pessoal que está à espera, muitas das vezes para ir buscar pão, que espere e desespere. Os velhinhos primeiro. E no alto posto que a sua idade lhes confere, mandam toda a gente que os contraria ou lhes chama a atenção para o caralho. Que lindos os nossos velhinhos. Não serão todos assim, como é evidente, mas não me venham com merdas que coitadinhos, é a demência e o alzheimer e o caracinhas. Alguns são mesmo uns sacanas filhos da mãe. Até porque, como diz o outro, é filho de Deus e está protegido, não há vírus que lhe pegue. Ou a outra que em 76 anos só teve papeira, a filha é que tem a mania das doenças. Estes, se caírem numa cama de hospital e não tiverem ventilador, porque os médicos terão de escolher que pacientes ventilam, se calhar vão arrepender-se. Ou não. Vão achar que isto é como a eutanásia e os querem matar, coitadinhos deles...

Depois há os outros, os que são abandonados à sua sorte, estão sozinhos e sem apoio. Não, não pode ser tudo enfiado no mesmo saco. Não são (somos) todos iguais. Infelizmente por causa dos sacanas, lixam-se os inocentes.

Hoje não liguei a TV nas notícias enquanto tomava o pequeno almoço, mas fui espreitar o Facebook (esperta, eu). Mais do mesmo, mas houve um vídeo de Espanha que me tocou e me fez cair uma lágrima (algumas, vá): em frente a um hospital um desfile de carros da polícia e dos bombeiros, todos com as luzes e as sirenes ligadas. Pararam em frente ao hospital, saíram das viaturas e ficaram a bater palmas aos profissionais de saúde, os guerreiros da linha da frente desta guerra que enfrentamos. Emocionante. A pessoa que filmou estava também muito emocionada, como se podia perceber pelo que ia dizendo, com voz embargada. Retida na sua varanda, filmou este momento de solidariedade e apoio entre os profissionais que estão nas linhas da frente, enquanto nos pedem que fiquemos em casa protegidos, eles estão na rua a fazer o que podem para travar esta pandemia e garantir que havemos de ficar todos bem. 

Bonito gesto. Belo momento de humanidade. Haja esperança!

 

23
Mar20

Quarentena, a pior inimiga do consumo, a melhor amiga da poupança!

Ora bem, com esta quarentena forçada encaro algumas coisas com outros olhos, os olhos de quem está fechada em casa sem poder ir à rua (poder posso, mas não sou estúpida). Por exemplo, andava aqui vai não vai para encomendar umas sapatilhas lindas e fofas da Mustang para a Primavera. Ora, não só o site onde as ia comprar encerrou as vendas online (sim, ao contrário de muitos que mantêm atividade de venda online) como, verdade seja dita, umas sapatilhas novas para quê mesmo, se nem as que tenho estou a fazer uso delas? Pois...

E logo a seguir vem tudo o resto. Recebo as newsletters de marcas/lojas que gosto e onde vou comprando, e agora nem dá vontade de abrir só de olhar para o assunto. Peça tendência para esta primavera... o que não pode faltar no seu roupeiro... não perca a nova coleção... O apelo ao consumo sazonal das coleções de fast fashion está totalmente fora de contexto.

A bem dizer hoje recebi uma newsletter que fazia jus à situação em que estamos: roupa ideal para estar em casa. Isto sim é marketing do bom. A malta não está a pensar nos calções da moda, no vestido tendência. Está certamente a pensar em reforçar o stock de pijamas e fatos de treino. Sandálias ou as sapatilhas mais trendy? Para quê? Ir ali à varanda acenar de longe ao povo? Chinelo ou pantufa. Tá ótimo. E a nova coleção de swimwear? Tomara eu poder dar uso ao que tenho do ano passado, é sinal que no verão posso ir à praia em segurança, nem que seja aos fins de semana, já que as previsões apontam para esquecermos férias de verão.

Tenho agora olhos de quem vê o roupeiro cheio de roupa que atualmente não visto porque não saio de casa e em casa, já é prática há muito minha, gosto de andar com roupa dita confortável: leggings, sweats, t-shirts quando estiver calor, calções ou vestidos de moletom. Tenho animais, e quero pegar-lhes ao colo sem receio de me puxarem um fio a uma blusa ou a um vestido, costumo cozinhar, e desculpem lá, gostaria de ser como a Filipa Gomes que cozinha com aqueles vestidos super giros de pin up girl, mas em mim seria um resultado catastrófico de nódoas e polka dots. Mesmo com a dita roupa de andar por casa, a cozinhar ponho sempre o avental e às vezes nódoas acontecem à mesma. E nas limpezas? Uso lixívia ou produtos com lixívia nas casas de banho. Certinho direitinho acabar com um pingo cor de rosa na roupa...

Assim, o email vai-se enchendo das newsletters a apelar ao consumo da nova estação de fast fashion e eu não estou nem aí para ver ou tão pouco desejar comprar o que quer que seja.

Só quero mesmo voltar a vestir o que está ali no roupeiro parado por força das circunstâncias e pôr pé no mundo lá fora... seria sinal de liberdade, de está tudo bem, podem vir!

 

23
Mar20

Quarentena: dia 6

Passou o fim de semana, de quarentena, claro. Já o anterior havia sido, portanto como fim de semana não foi muito estranho.

Sábado andámos os dois entretidos com a limpeza do palácio. Como tempo era coisa que sobejava, o homem até se pôs a destralhar e arrumar gavetas e cenas dele (e ele é uma espécie de acumulardorzinho do raio, que acha que uma merda que já nem funciona não vai para o lixo porque "pode dar jeito").

À conta disto almoçámos às 16h, jantámos às 22h... e os horários "normais" ficaram assim meio que estranhos. Próximo dia de limpezas vai incluir os vidros (se não chover).

Domingo aproveitou-se o sol no terraço, estendeu-se roupa, fez-se um assado, viu-se séries e dormiu-se a sesta no sofá. Pela janela da sala vimos imensa gente a passar a pé e de carro, parecia um típico domingo de passeio e convívio familiar. Nada contra se não houvesse ordem para ESTARMOS TODOS EM CASA, CARALHO! é por causa destas mentes idiotas que esta situação pode (e vai, com toda a certeza) prolongar-se no tempo, e quem já está a fazer os sacrifícios necessários acabará por pagar uma fatura mais cara. Ao mesmo tempo penso cá com os meus botões (e que se foda quem achar que estou a ser uma cabra do pior) que para esta gente que ignora as diretrizes da OMS, da DGS e do governo, que não vê os números assustadores nos países mesmo aqui ao lado, então que o COVID-19 seja uma seleção natural para limpar a estupidez humana que abunda por aí.

Bem, começa-se mais uma semana de quarentena. Efetivamente vale-me estar em teletrabalho para me obrigar a ser mais disciplinada e manter horários (e rotinas). Espero que com os dias o hábito se instale e venha a sensação de normalidade... tenho é de evitar ver notícias, ou ver muito pouco, já que quando vejo as notícias entro em ansiedade e ontem tive um pequeno ataque de pânico de manhã, quando via as notícias ao pequeno almoço.

O fim de semana ficou marcado por uma agradável surpresa. Um telefonema do meu pai, que visitei pelo Natal e depois disso ele nunca mais deu sinais de vida, a querer saber se estávamos bem. Fiquei boquiaberta, confesso.

Venha lá mais uma semana de quarentena, que esteja sol para poder ir até ao terraço levar uma revigorante dose de vitamina D. E haja paciência para viver um dia de cada vez, da melhor forma possível, torcendo para que este pesadelo tenha os dias contados e possamos, por fim, regressar com segurança ao mundo.

 

20
Mar20

Quarentena: dia 3

Chego ao terceiro dia. Confesso: hoje estou em dark mood. 

Tenho ligado a TV na Sic Notícias enquanto tomo o pequeno almoço. Começo o dia a atualizar-me quanto ao tema que domina as nossas vidas e o mundo em que vivemos. Hoje vieram as lágrimas aos olhos, arrepiei-me, fiquei com um nó na garganta.

A situação em Itália é devastadora. Assustadoramente devastadora. 

O nosso governo vem regulamentar uma série de medidas que grande parte dos portugueses já estavam a fazer por iniciativa. Palminhas para o governo que seguiu o exemplo dos seus cidadãos. Não é por nada mas há cerca de duas semanas atrás vários municípios aqui do distrito de Aveiro já estavam a cancelar eventos públicos, a lançar os alertas para o isolamento social, empresas a tomarem medidas de prevenção, estabelecimentos comerciais, das mais variadas áreas, a fechar portas ou a restringir horários, acessos e serviços. Há restaurantes que só têm o serviço de take away, por exemplo. A Junta de Freguesia onde moro tem sido extremamente proativa e exemplar. Criou uma linha de apoio para idosos e doentes crónicos. A JF garante abastecimento alimentar e de medicamentos a estas pessoas. Anda a desinfetar espaços públicos. Começou por cancelar o mercado semanal que há todas as quintas, agora permite novamente a sua realização mas apenas e só com bens alimentares. O município de Ovar com o surto que teve, não esperou pelo governo central. Declarou estado de calamidade e todo o concelho está com encerramento sanitário: ninguém sai, ninguém entra (ainda que estejam a ocorrer "furos" porque há empresas que ainda não pararam a laboração e as pessoas vêem-se forçadas a furar as barreiras para ir trabalhar). Passam imagens de cidades desertas que me fazem lembrar filmes de ficção científica, quando o mundo era invadido por aliens...

Depois o resto do mundo. A situação em África é preocupante pois prevê-se que milhares de casos não sejam sequer identificados, quanto mais controlados. A falta de condições a vários níveis vai ser um rastilho de pólvora seca. 

O príncipe do Mónaco está infetado. A prova que este vírus não distingue classes sociais, económicas, o que seja. Somos todos humanos, igualmente vulneráveis. 

EUA fecham fronteiras. 

As imagens de cidades desertas espalham-se pelo mundo todo e eu, que até tenho andado calma e relativamente otimista em relação a Portugal e a conseguirmos controlar a pandemia, vejo o resto do mundo nesta luta desigual contra um inimigo invísivel, um inimigo que nos pode "apanhar" só porque tocamos numa maçaneta de uma porta. 

Estamos todos juntos nesta guerra. Somos todos vulneráveis. Somos todos humanos, feitos da mesma carne e do mesmo sangue, com o mesmo risco de infeção por Covid-19 independentemente da cor de pele ou do status social ou da conta bancária.

Este vírus veio lembrar-nos de muitas coisas que estavam esquecidas. A nossa vulnerabilidade. A nossa frágil condição de seres humanos. Este vírus veio mostrar-nos que precisamos abrandar, que a felicidade e a vida não se mede pelo que se tem, pelas viagens que se faz, pelas coisas que compramos e exibimos na nossa fútil vaidade. Veio mostrar-nos que afinal não estávamos assim tão mal, que até tínhamos uma vida boa só pela liberdade de sairmos à rua com segurança, de nos vestirmos para irmos trabalhar, mesmo naqueles dias em que o sono era maior e a preguiça nos fazia desejar ficar em casa (ops, será que depois deste isolamento vamos voltar a desejar isto?). 

Hoje é o meu terceiro dia de quarentena. Hoje sinto-me mais triste, sombria, assustada. Mas prefiro agarrar-me à esperança de que vamos, todos juntos, conseguir ultrapassar este momento difícil que o mundo atravessa. Que, por ora, as minhas pessoas estão bem e em segurança. Que eu estou bem e em segurança. Que ainda temos meios para acedermos ao que precisamos para sobreviver a estes dias, que nos são tão estranhos e diferentes do que conhecíamos e estávamos habituados. O nosso Portugal é feito de gente com fibra e garra. Somos um dos países mais antigos do mundo. Expulsámos mouros, espanhóis e franceses. A nossa história centenária está repleta de momentos de crise em que nos conseguimos reinventar e renascer. Assim será com este inimigo que nos invadiu o território, nos entrou pelas casas adentro e virou as nossas vidas do avesso. 

Juntos venceremos! 

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