...
A escrita é um exercício libertador. Terapia pura. Um encontro com o mais profundo do nosso ser interior.
A imersão às profundezas das nossas trevas é dolorosa. E por isso tanto a evitamos. Os últimos meses foram de sucessivas e necessárias imersões às minhas sombras. Enfrentar as dores de frente. Por mais que doessem e me atirassem ao chão (e como eu fui ao chão, de alma rasgada e coração a sangrar). Não o teria conseguido sozinha. Terapia, terapia, terapia. Desenvolvimento pessoal e muito trabalho de autoconhecimento.
Crescer dói. Muito. É essa dor o catalisador para o desenvolvimento: tomar consciência, aceitar, integrar. Transformar a dor em amor é um processo. Não uma aspirina. Leva o seu tempo e cada um tem o seu próprio ritmo. Há mergulhos que nem sempre se fazem à primeira ou à segunda tentativa. Há sombras que demoramos a conseguir enfrentar. E as feridas abertas há anos, não é com 3 dias de "antibiótico" que fecham. É um processo, não um momento. É um trabalho diário, contínuo. Exige entrega, dedicação, esforço. Coragem, claro. Muita. E humildade. Todo este trabalho de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal é feito com humildade. Humildade na entrega. Humildade a olhar para nós próprios, para dentro de nós. Humildade a tomar consciência do que somos e do que carregamos, de onde vimos e o que trazemos. Humildade em aceitar tudo aquilo que nos conduz. Humildade perante a vida. Humildade para com o outro.
Crescer dói. E torna-nos fortes. Capazes. Emocionalmente maduros, conscientes. Enfim, adultos, únicos responsáveis por si próprios e pela sua vida. Lidar com a dor faz-nos transcender, no sentido da evolução do nosso eu: superamo-nos, excedemo-nos. E enfim, aceitamos a morte como energia transformadora. Matamos a nossa criança ferida para que o adulto consciente, responsável e capaz possa nascer e ocupar o seu lugar. Morre a menina para nascer a mulher. Encerram-se ciclos para que novos irrompam. Morrem as ilusões, as expetativas, e assim desperta a consciência.
Tanta coisa morreu em mim, na minha vida. E doeu cada morte. Cada fim. Cada término. E só quando chegou aquele momento em que aceitei que tudo foi como tinha de ser, que cada morte foi necessária para eu estar exatamente onde estou, então a dor foi ficando mais leve. A dor transmuta-se em amor. Amor por tudo o que foi, como foi. Gratidão por tudo o que morreu para que algo novo pudesse nascer. Tanta coisa surgiu nova em mim, na minha vida.
A viagem não terminou. Não há um destino de chegada. Há uma jornada. E é um caminho que se vai trilhando, dia após dia. Com maior consciência. Com mais leveza. Com serenidade. E desafios. Sempre. Fazem parte e graças a eles evoluímos.
A escrita é um exercício libertador. Terapia pura. Um encontro com o mais profundo do nosso ser interior. Tem feito parte da minha jornada. Numa vertente de psicoterapia, mais introspetiva, reflexiva, de transmutação. E agora, talvez seja o momento de ressurgir à luz do dia. Permitir-me escrever e ser vista. Mesmo que continue a escrever, em primeiro lugar, para mim.